sexta-feira, 9 de maio de 2014

Paris é uma festa, Fabio Coutinho


 
                                                                   
 
 
   Em memória de Jório Salgado Gama Filho (1940-2013),  primo querido, amigo perfeito
 
 
No campo estritamente livresco, por certo o de maior interesse aos leitores desta publicação, o ano de 2014 marca, entre tantas datas importantes, o cinquentenário do lançamento póstumo, em 1964, de uma obra preciosa, americana na origem estética e universal no legado humanista.
 
Morto em 1961, Ernest Hemingway deixou pronto o seu extraordinário A moveable feast, editado postumamente, nos Estados Unidos, há exatos 50 anos, pela prestigiosa casa livreira Simon&Schuster. Entre nós, foi traduzido pelo grande Ênio Silveira e ganhou o inspirado título de Paris é uma festa .
 
O livro é a crônica apaixonada e reverencial dos anos que o fenomenal homem de letras passou em Paris, de 1921 a 1926. Trata-se de memórias de diversos (e fascinantes) lugares e ambientes da Cidade Luz e, também, do convívio privilegiado com outros luminares expatriados na capital francesa naquele período, tais como F. Scott Fitzgerald e Gertrude Stein. Com elegância de mestre precocemente consumado, Hemingway traça um suave perfil de sua primeira mulher, Hadley, e compartilha lembranças dos tempos augurais às voltas com o ofício em que se tornaria, em prazo relativamente curto, um artífice poucas vezes superado.
 
Autêntica celebração intelectual, o livro traduz, com brilho invulgar, o exuberante clima cultural de Paris, logo em seguida ao fim da I Grande Guerra, e o espírito jovem, a forte criatividade e o entusiasmo irreprimível que o próprio Hemingway personificava de maneira arrebatadora.
 
Ernest Hemingway fez mais para mudar o estilo da prosa em língua inglesa do que qualquer outro escritor no século XX, e isso se traduziu na justíssima concessão do Prêmio Nobel de Literatura, que a Academia Sueca lhe outorgou, em 1954.
 
Seus livros The sun also rises  (O sol também se levanta) e A farewell to arms (Adeus às armas) colocam o artesanato textual de Hemingway como dos mais prodigiosos levados a cabo na arte da ficção, em qualquer época. Como integrante da comunidade de expatriados na Paris da década de 1920, o antigo jornalista e motorista de ambulância iniciou uma carreira de literato com dedicação exclusiva, que o levou a uma projeção sem limites e sem retorno. Aficionado por touradas e caçadas, Hemingway admirava a coragem e a entrega incondicional dos praticantes desses esportes, que não raro sofriam castigos físicos e psicológicos de graves e dolorosas proporções.
 
Como repórter, Ernest Hemingway cobriu a Guerra Civil espanhola (1936-1939), retratando-a no romance For whom the bell tolls (Por quem os sinos dobram) e, também, a II Guerra Mundial (1939-1945). Por sua clássica novela The old man and the sea (O velho e o mar), foi agraciado com o Prêmio Pulitzer de 1953.
 
Nascido em Oak Park, Illinois, em 21 de julho de 1899, Hemingway faleceu em Ketchum, Idaho, onde possuía um rancho, alguns dias antes de completar 62 anos de idade. Trágica e violentamente, deu fim à própria vida, que, então, já não lhe era mais uma festa. Deixou milhões de leitores de várias gerações, em todos os cantos da Terra, de Keywest a Madrid, de Havana à amada Paris de sua culta e festejada juventude.