sábado, 12 de janeiro de 2019

Cálculo das dores, RCF


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Alguém dirá que dor é dor
e não se pode medir,
pesar e estudar sua matéria:
ferro, madeira, plástico ou chumbo.
Certo que existem dores finas:
e não importa se são agudas,
mais científico seria entender
sua duração transversa,
seu sofrimento em minutos
ou horas ou dias ou meses,
ou ainda, que fundura
de matéria da alma – por que aqui se fala
da dor que não é fratura exposta –
atingiu o instrumento agudo
na carne do espírito. Outros creem
que a dor rombuda, robusta
já no nome, forte mesmo em sua
constituição, perverte os sentidos.

Enfim, a espessura nada mensura
e só quem a sofre pode afirmar
se dói fino ou rude. Só quem sofre
pode denunciar: não importa se aguda
ou nodosa
antes que espessura
mais vale investigar se a dor perdura,
se permanece raiz,
se nasce mas não morre,
se gruda na alma como queimadura
que, mesmo amainada,
a cicatriz não deixa que se esqueça
que um dia o fogo alcançou
a fina pele da ausência.


(O difícil exercício das cinzas, 2014)

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